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terça-feira, 18 de julho de 2017

Idiotização das gerações: as palavras e a música.

   Se você é professor de Língua Portuguesa experimente fazer uma coisa bem antiga e caída de moda com os seus alunos: um ditado de palavras. Um simples ditado. Peça pra que eles digam depois quais as palavras que eles conhecem. Você ficará surpreendido (e não no sentido positivo) com o resultado. Alguns não vão saber nem escrever as palavras que você irá ditar. Pra mim, isso funciona como um diagnóstico. Daí eu sei quem eu tenho nas mãos e o quanto de trabalho vai me custar. Se um médico pede exames, um professor precisa enxergar com uma lente bem clara a “doença” que tem pela frente.
   A falta de vocabulário, já dizia Paulo Rónai, impede o pensamento. É uma doença, portanto, já que somos seres pensantes. Ou não somos?
   Ah, as palavras.  As palavras são coisas antigas, códigos indecifráveis....eles até se riem de algumas:  “Que palavra é essa, professora?” “Pra que usar uma palavra como essa?” . Às vezes é uma palavra ridiculamente banal, alguma que eu já sabia o que significava desde os meus onze anos, mas eles nunca a viram, NUNCA, e já estão pra ingressar na faculdade, porém  não veem necessidade de usar ou saber o que significam se conseguem se comunicar usando um “qualé”? Um dia usei a expressão:  “a perder de vista” e me perguntaram o que significava “aquilo”...
   Que mundo é esse em que vivem esses jovens? Um mundo sem palavras é um mundo que reduz o homem à bestialidade. E, culturalmente já estamos vivendo essa bestialidade representada nas músicas populares brasileiras atuais, na produção cultural da TV, na imprensa, que mal merece o nome que tem, em todo lugar .
   A falta de pensamento impera em tudo, a mesmice, o olhar viciado, a repetição, a falta de ideias, o veneno do imediato, que canta abreviando as palavras, que não são mais bem vindas.  Eis o que impera no mundo da música que esses adolescentes escutam:

    “Eu quero tchu, eu quero tchã. Eu quero tchu tcha tcha tchu tchu tchã. Tchu tcha tcha tchu tchu tchã”.

   Tudo está dito. Pra que usar palavras?  A onomatopoeia garante a expressividade total….


“Sou simples. Mas eu te garanto. Eu sei fazer o Lê lê lê. Lê lê lê. Lê lê lê. Se eu te pegar você vai ver. Lê lê lê. Lê lê lê”.
    
   Viu só? Que maravilha de expressividade!
    
  Esse aí é o cawboy universitário, ou melhor, o sertanejo otário...rs Elementar , meu caro Watson…

   E nem é a pior coisa que existe. Pior, pior mesmo é o nível do funk criminoso, que anda por aí, com MCs de 12 anos falando obscenidades violentas e sendo consumido normalmente e produzido por gente, obviamente, sem ética, sem gosto musical, sem senso de humanidade, sem amor no coração...pra dizer o mínimo.
Mas as pessoas acham divertido e inocente tudo isso. Acham legal que uma pessoa como Anita faça carreira internacional e seja considerada uma grande  artista  Não é a toa que ela cantou com Caetano na abertura da Olimpíada pra mostrar o Status quo.  Para se consagrar como grande artista. E mostrar quem ‘’é que manda” na música nesse país. Os fãs de Anita e desses funkeiros ferozes (são inumeráveis, mas mal consegui terminar de ver um clipe de um deles) , dizem que eles são o que o    povo quer, têm sua razão de ser.  Para mim, é aviltante....
   Vi inclusive um deles que usa correntes grossas de ouro no pescoço, quilos de ouro, sendo entrevistado num programa de moda bem conhecido, que não vou citar o nome, que não quero me comprometer( dado o momento estranho que estamos vivendo), como se, seu estilo de vida, de música e de se vestir fosse uma coisa bacana, venerável e digna de ser copiada como exemplo, Esse,  tem até nome.  Chama-se: “funk ostentação”.  

Funk ostentação
   Lendo comentários da área de música na internet, que é uma coisa que me interessa e da qual me sinto próxima, pois minha filha trabalha com música, vi alguém dizendo que isso não é só no Brasil, é uma tendência mundial. Dei-me ao trabalho de verificar com calma a letra de uma música de um top americano, que, aliás considero um músico fantástico, devo dizer(o Bruno Mars) , mas vejam a “preciosidade" da letra (traduzida,  aí abaixo):

Vou alugar uma casa de praia em Miami

Acordar sem pijamas
Cauda de lagosta para o jantar
Julio, sirva esse lagostim
Você pode ter isso se você quiser
Ter, ter se você quiser(...)

Pegue a minha carteira agora, se você quiser

Entre no meu Cadillac (garota, vamos rodar umas milhas nele)

Qualquer coisa que você quiser (basta pôr um sorriso no seu rosto)
Você merece, gata, você merece tudo
E eu vou dar a você

Estas joias de ouro brilhando 

Morangos e champanhe no gelo
Sorte sua que é disso que eu gosto, é disso que eu gosto
(...)

Sexo perto da lareira durante a noite

Lençóis de seda e diamantes, todos brancos
(...)
Eu estou falando viagens para Porto Rico
Diga a palavra e nós iremos
Você pode ser a minha safadinha
Garota, e eu vou estar no ponto, gatinha
Eu nunca faço promessas que não posso cumprir
Eu prometo que você vai sorrir e nunca vai querer ir embora

Maratonas de compras em Paris

Tudo de 24 quilates
Dê uma olhada no espelho
Agora me diga quem é a mais bela
É você? (É você?) Sou eu? (Sou eu?)
Diga que somos nós (diga que somos nós) e eu vou concordar, baby


   Remete à ostentação, ou não???
    É claro que isso se deve a questões mercadológicas... Tenho certeza que um músico tão bom quanto Bruno Mars, pode cantar de outra maneira e servir a outros deuses melhores do que ao rei da futilidade e do vazio existencial. Mas não existe mais o músico que faz o que quer...
   É claro que essa idiotização serve e interessa a alguém... Por outro lado, há uma elite intelectual que apoia, através de movimentos midiáticos essa idiotização(lembrando da “presença de Anita”, sem trocadilhos com a série globete,  rs,  nas Olimpíadas) até mesmo , pasmem, professores universitários e intelectuais, gente ligada ao grande poder.Claro, essa gente fatura e fatura muito com isso!
   Veja-se programas como o  “The Voice”  brasileiro em que Claudia Leite detém poder de grande dama da música , e Michel Teló aparece como representante do gosto da classe popular. Mas,  como é que o povo, essa entidade chamada povo,  passou a gostar de coisas assim? Será que ele tem oportunidade de conhecer outras coisas? 
   Quando eu era criança ouvíamos boa música,  de tudo: Roberto Carlos (das antigas , antes de “embregar”), Caeteano Veloso, Stevie Wonder,Tim  Maia, Beach Boys, Nina Simone, Secos e Molhados, Raul Seixas, Rita Lee, só pra falar de 1%. Raul ; Rita;  Lobão, o doce maldito, por exemplo,  frequentavam programas populares como o Chacrinha. Mas o que se vê nos programas populares hoje em dia?  Sem falar do que meu pai ouvia: música clássica, ópera,Frank Sinatra,  Lupicínio Rodrigues, Pixinguinha (e a música de ninar que eu cantava pra minha filha dormir sempre foi “Rosa”), coisas assim...sem falar dos fados portugueses (isso pelo lado do meu avô,  que era português...me lembro de Francisco José: “De quem eu gosto nem às paredes confesso”rsrs); minha mãe gostava de sambistas como Paulinho da Viola,e tinha paixonite aguda por Chico Buarque. Também adorava Elis Regina. Imagina o caldeirão cultural a que éramos submetidos!

Pixinguinha, o Rei

    Mais tarde apareceu a Radio Rock, a Fluminense, que tocava Blitz, Legião, U2, The Police, Lobão, Paralamas, e todo o rock nacional emergente (que tinha boas letras, irreverência, toques políticos  e qualidade artística), e  poderia ser ouvido indiscriminadamente por todas as classes.Mesmo que se diga que a classe popular não gosta de rock, o que é uma mentira , que se pode provar facilmente...afinal , os Beatles , os Stones e tudo o mais vieram das classes populares e hoje em dia ainda fervilha, tentando sobreviver,  o rock na Tijuca, no Rio de Janeiro,  dentro de uma classe média popular, só pra falar do que eu sei e conheço...

Lobão,  doce maldito 

    As rádios tocavam até Zé Ramalho que hoje em dia, é considerado um músico da elite. Sim, os versos poéticos, quase surrealistas, da música de um Zé Ramalho apareciam e podiam ser apreciadas na rádio. Hoje em dia, os filhos daquela geração que apresentam a música para seus filhos,  ainda têm acesso à boa  música.E os outros? E os que virão? O que vai sobrar pra eles?
   Quem está por trás disso? É bom a gente pensar nessas coisas...
   Cansei. 

   Volto outra hora!

De presente pra vocês que me leem, “Chão de Giz”;


quinta-feira, 6 de outubro de 2016

E fiquei a ver navios...

Entrei de gaiato no navio
Oh!
Entrei, entrei
Entrei pelo cano...
Melô do Marinheiro, Paralamas

Estava esses dias revendo fotos das Olimpíadas e, como ela já passou, vou contar essa história, pra não esquecer:


A melhor metáfora da Olimpíada no meu caso pessoal, foi o navio Sagres português e ao lado dele o impávido “Cisne Branco”, lindo, em toda a sua glória. E, todo mundo riu no meu trabalho quando disse que sonhei com o navio português: na verdade, sonhei com o “Cisne Branco” achando que ele fosse o navio português.

 Mas não sonhei: tive pesadelos. Explico: desde o início meu único desejo nas olimpíadas era visitar esses dois navios e ver o basquete na cadeira de rodas nas paraolimpíadas. Não consegui nenhum dos dois. Com os navios, o problema eram as filas; com a paraolimpíada, os ingressos.





























 No primeiro dia em que fui ao Boulevard, uma fila monstra, um sol de lascar . Ali naquela hora, parecia muito ruim entrar numa fila pra ver navios e abrir mão de ver todo o resto, que parecia mais tentador...Segundo dia: outra fila monstra; terceiro dia, chego às quatro e meia de um dia em que a marinha se dispôs a mostrar os navios até às cinco horas. E isso, correndo contra o tempo, vinda do trabalho esbaforida, aquela coisa toda. Imagina a minha decepção, quando ouço o guardinha fardado de azulzinho falando:

- O capitão decidiu fechar a fila às duas e meia.

 Enquanto vários turistas ficavam reclamando entre si,  eu ousei dizer pro homem fardadinho (porque tenho o maledeto hábito de falar quando os outros calam...):

- Mas, me desculpa, não era até às cinco?

- Era, mas a fila estava muito grande e o capitão decidiu finalizar mais cedo...

-Por quê?

- Porque tinha muita gente.

- Meu querido, vai ter sempre muita gente, é uma olimpíada...

Ele desconversou, gaguejou um pouco, virou pro outro lado tentando responder a uma turista pra fugir ao meu questionamento.
Aquilo não era justo. Chego ao meu trabalho no outro dia e descubro que uma amiga ficou duas horas na fila, debaixo do sol. O outro, tomou um fora como eu, em um dia em que o capitão resolveu finalizar a fila ao meio dia!!! Mas conseguiu ver num dia em que era jogo do Brasil e a fila por milagre, desapareceu...é, não ia ser fácil visitar aqueles belos navios...

Fui mais duas vezes sem êxito, muita fila e capitão fechando antes do prazo combinado.

Não desisto e volto numa quinta tentativa, no último dia.Chuva.  E eu fico toda animada quando vejo o Boulevard meio vazio e acho que vou conseguir daquela vez. Do outro lado da baia os navios me sorriem lindos, melancólicos, reis absolutos no meio da chuva do domingo triste.Mas, lá estão os guardinhas, e as porteirinhas fechadas a acabar com  a minha alegria.

 O mundo dos fardados. E, eu lembro que não é tão fácil abrir portas quando um fardado as fecha...

Eu me lembro do meu pai ferrado no regime militar, eu me lembro de tudo e não dá outra...

Lá estão duas nisseis, com cara de bobas e o guardinha de azul balançando a cabeça pra elas que o miram decepcionadas, de longe eu vejo a cena e já adivinho tudo. “Nunca vou pisar no Cisne Branco, com que sonhei”, eu penso com um horror quase infantil. Vou ter que matar esses guardinhas antes...

Chego mais perto e o olhar duro do fardadinho empertigado, treinado, de ordem absoluta , de obediência cega, me atravessa como uma pedra bruta (sinto até um arrepio). Pergunto (já sabendo a resposta):
- Onde está a fila pra ver o navio português?

- O capitão resolveu não abrir hoje.

Ah, o capitão! Ele resolve tudo...e decide tudo. Que poder o desse capitão que ninguém vê e ninguém sabe quem é!!!! Uma perfeita figura kafkiana! Lembro-me do “Castelo “de Kafka, livro que me angustiou  a ponto de não conseguir terminá-lo. E sinto que ainda vou ter pesadelos com esses navios...

- Como assim? Não era o ultimo dia de visitação hoje?
- Era. Mas, ele resolveu não abrir...

- E por quê?

Gaguejos, pigarros, a ânsia da hipocrisia habitual.

- Ontem teve muita gente e...

- Mas não era até hoje?

- Era, mas...

Novos gaguejos .

- E o navio brasileiro, o Cisne Branco, eu não posso visitar?

- O brasileiro vai ficar fechado também...

- Por quê?

- Porque o brasileiro foi na onda do português...

Era inútil entender tal ideia.

- E amanhã?

-Amanhã eles vão embora, como já estava combinado -  o  guardinha fala isso com  o orgulho da palavra empenhada e com a alegria de ferir o desejo alheio...

(A força dos fracos está em impedir o prazer dos fortes.rs)
Então era assim: o dia de ir embora era certeiro o combinado, mas não o de ficar. Injúria!

- Isso não tá certo, era hoje o último dia, vocês não tem o direito de impedir a visita...

- Senhora....

- Isso é um absuurrrrdo!!! – e eu, mal continha a minha fúria.

As nisseis começam, embaladas pelo meu poder de persuasão, a tentar protestar também. O empertigado endurece mais e fala mais coisas sem sentido, sem nenhum senso de lógica.

Vejo que não tem solução e revoltada, enfio o dedo na cara do guardinha e digo:

- É assim, não é, vocês fazem o que vocês querem? ...É isso...eu vou falar mal de vocês no meu blog...-  e sacudo veementemente o guarda-chuva nas mãos, tentando parecer ameaçadora.

Se fosse uma ditadura militar eu teria apanhado bem ali na hora e muito, mas meu namorado me puxou sutilmente pro lado antes que eu falasse algo que me faria ir pra cadeia ou responder a um processo...rs.  Ele me diz depois que provavelmente eles estavam rindo de mim, se f...pro que penso ou falo deles, de ressaca do jogo do Brasil no dia anterior e por isso não tinham aberto, porque não sobrou um guardinha DE PÉ pra tomar conta dos navios.E devia ser isso mesmo. E eu, não passava de uma mulher patética pra eles, querendo à força, visitar dois navios idiotas que eles estavam cansados de ver todo dia...rs

Mas, não são inocentes.

Arbitrários, eles fechavam portões, passagens, e soltavam fogos conforme lhes convinha... foi assim no show dos Paralamas, justamente quando eles cantavam em alto e bom som “QUE PAÍS É ESTE?” , uma saraivada de fogos foi levantada, pra abafar o som da banda...

E fui arrastada pra ver os navios, outra vez, de longe.

E fiquei ali, a ver e ver navios...

PS – Depois fiquei sabendo pela internet que foi considerado um programa de índio por algumas pessoas que estiveram lá. Um dos internautas, descendente de portugueses, chegou a dizer que “deu vontade até de trocar o sobrenome”...rs. Mas , isso , pra mim, não foi um consolo. Quanto aos ingressos da paraolimpíada, e meu sonho frustrado de ver aqueles superatletas do basquete, uma confusão total, golpes, cambistas e um site totalmente bagunçado, como todo mundo viu...fui!